Relato de Lua

 
 
Meu nome é Luana… Mas pode me chamar de Lua
Nunca me considerei uma pessoa muito normal e tenho meus motivos pra dizer isso… Mal completei duas décadas neste mundo e já vi, senti e vivi muita coisa fora do normal na minha vida… Eu perseguia o insólito tanto por já estar de certa forma acostumada a ele desde criança, como porque tinha um objetivo e queria ajuda de forças além do humano…
…Então, depois de uma certa noite em que realmente quase morri, agora venho tentando apenas levar uma vida normal de caloura universitária…
Mas o insólito sempre me persegue de algum modo… Pois comecei a descobrir que outras pessoas da minha faculdade já viram ou ouviram coisas que não podiam explicar em algum momento da vida… Será que até pessoas normais também vêem coisas que desafiam sua normalidade ou tudo aquilo que consideram real?
 
Esse relato é o registro que fiz de um caso contado por um um colega de faculdade, que vou chamar aqui de Arthur… Ocorreu um mistério na família dele tem alguns meses…
A tia dele, que aqui vou chamar de Mayra, morava apenas com os pais desde que o pai dele — irmão bem mais velho dela — havia se casado… Ela nunca havia se mudado apesar de já ter mais de trinta anos, e vinha tendo depressão há algum tempo… Mas isso era uma coisa que ela já tinha há anos, então ninguém se preocupava muito.
Uma manhã em que os pais dela saíram para a igreja, como faziam todas as semanas, Mayra ficou sozinha em casa. Quando eles voltaram não a encontraram, mas de certa forma tudo bem, pois ela tinha a vida dela apesar de não morar sozinha… Então eles logo descobriram que havia um bilhete fixado na geladeira com ímãs de cozinha, dizendo que naquele dia Mayra iria à praia com duas amigas para se distrair e tentar levantar seu astral e só voltariam a noite.
Ao final do bilhete algo que a avó de Arthur estranhou um pouco ao ler, mas demorou a dar a devida importância: sua filha pedia desculpas por nunca ter conseguido ter um rumo na vida e os agradecia por tudo até ali, então na última linha ela dizia que os amava muito.
 
Tarde da noite daquele mesmo dia Mayra não voltou e nem deu notícias… De manhã a avó do Arthur ligou para a casa das amigas da filha, mais nem a mais próxima sabia dela, e contou que já não falava com Mayra há mais de uma semana. Então, quando o dia seguinte chegou foi a vez do pai de Arthur receber uma ligação de sua mãe preocupada, na esperança de que Mayra tivesse ido para a casa do irmão ou comentado seus verdadeiros planos com o sobrinho, com quem costumava ter conversas mais sinceras do que com o resto da família…
Tudo que Arthur se lembrava era de ter falado ao telefone com a tia por mais de uma hora três dias antes do tal passeio na praia, e de ela ter dito algo engraçado ao se despedirem… Algo como “aconteça o que acontecer não esqueça que te amo muito”… Arthur agora estava com muito medo de que aquela fosse a última vez que havia falado com a tia, porque eles eram realmente próximos e ele sentia falta dela.
 
Ele desabafou sobre isso tudo isso para uma amiga em comum nossa, e eu por acaso estava junto … Em uma daquelas conversas de intervalo de faculdade que acabam tomando um rumo mais intimista meio sem querer…  Não sou tão amiga dele, mas notei que Arthur realmente parecia bem preocupado com a tia dele, esteja ela onde estiver…
No dia que nos contou essa história ele disse que já fazia sete meses e até hoje ninguém mais soube mais nada sobre o paradeiro da tia de Arthur. O pai dele acha que a irmã pode ter cometido suicídio, o avô não quer tocar no assunto até que Mayra volte e a avó apenas diz que a filha é maior de idade para saber o que faz…
A mãe de Arthur fala que ela deve estar bem vivendo em outra cidade e vai aparecer totalmente mudada qualquer dia… Mas ele acha que a mãe dele não acredita nisso de verdade, e só diz para ele não ficar triste porque tudo aponta para um suicídio, até por ela ser uma pessoa sem rumo, meio deslocada na família e tals… Mas Arthur realmente prefere acreditar que exatamente porque sua tia estava bem triste há anos com a vida que levava, de repente ela tenha ido para longe, para refazer a vida em outra cidade…
“Quem sabe  até se casou e fugiu com alguém que sabia que o pai e os avós dele não aprovariam ” — é o que ouvi Arthur dizendo, acrescentando que ela já havia namorado uma garota, e sua família possuía um pensamento bem conservador…  Sabe, eu sei que ele deseja muito que a tal tia esteja feliz em alguma cidade praiana, vivendo com “a mulher dos sonhos dela”… Mas… Sei lá, eu acho que essa mulher está mesmo morta! Seria a alternativa mais realista nesse caso…
Eu pessoalmente não acho difícil que, sendo uma pessoa como ele descreveu, que essa mulher pudesse mesmo ter sentido que a vida dela não fazia mais sentido cercada de pessoas que não a compreendiam… Mas claro que não contei o que penso pra ele!
Quem sou eu para tirar as esperanças do coitado! Só porque acho que faz todo sentido que a tia dele tenha se matado… Ele parecia um carinha que parece legal, mas tudo que ele contou aponta pro óbvio! Já que ela se sentia tão triste e deslocada quanto ele mesmo disse!  Eu mesma sinto isso às vezes, e olha que eu sou bem mais nova que ela! Até porque, como eu já disse, eu também não me considero uma pessoa que tenha uma vida muito padrão, igual a de todo mundo e tals… Sabe-se lá o quanto ela se sentia assim com o passar dos anos…
 
Mas por hora ninguém encontrou um corpo, então o mistério continua… Como tantas pessoas desaparecidas que existem no mundo… Hum… Será que se essa mulher estiver mesmo morta, quem sabe o fantasma dela tenta se comunicar em algum momento… Espero que o Arthur conte para a Roberta se acontecer e eu fique sabendo… Aí talvez ele e a família dele possam aparecer de novo em um próximo relato que eu deixar aqui! Seria interessante, mas devo respeitar o sofrimento da família…
Nossa, já estou viajando muito! Até parece que fantasmas se manifestam na vida de todo mundo  como se fosse algo tão banal… Aliás, a maioria das pessoas nem acredita nessas coisas… E eu provavelmente não serei levada à sério ao comentar sobre isso…
Acho que é melhor eu parar por aqui… e de um jeito ou de outro, por essa noite, é hora de “essa Lua” se pôr… Então por hora vou apenas me despedir…
 
 

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Nanda Miranda

Sou a antítese do paradoxo com premissas de incerteza e períodos de instabilidade… Nanda Diletante, vulgo Fernanda Miranda -- uma autora, fascinada por histórias sobrenaturais, que costuma compartilha-las no blogue Essência Diletante do Wordpress e no DiletanteCast pelo Spotify … Alguém que outrora já fez filosofia e psicologia, e já organizou e participou de várias antologias literárias, sendo uma de Portugal… Mas após o apocalipse nosso de cada dia tenta não sucumbir num surto coletivo de realidades estranhas. @nandadiletante

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